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domingo, 22 de abril de 2012

ARTIGO: O Adultério Casto


                                                                                            Igor Rodrigues Melo ¹

1 O ADULTÉRIO E SEU SIGNIFICADO NORMATIVO,  BÍBLICO E SOCIAL
Adultério é uma palavra que derivou da expressão latina ad alterum torum que quer dizer: “Na cama de outro (a)”. Suas raízes são antigas em nossa sociedade, bastante discutido, tanto sob a ótica social quando religiosa de nossa história. Várias civilizações puniam a prática do adultério que era considerado uma grande violação aos deveres conjugais, principalmente as mulheres eram as mais castigadas por essa prática ilícita.
O atual Código Civil brasileiro de 2002, em seu artigo 1.573, diz o seguinte:
Art. 1.573. Podem caracterizar a impossibilidade da comunhão de vida a ocorrência de algum dos seguintes motivos:
I - adultério;
II - tentativa de morte;
III - sevícia ou injúria grave;
IV - abandono voluntário do lar conjugal, durante um ano contínuo;
V - condenação por crime infamante;
VI - conduta desonrosa.
Parágrafo único. O juiz poderá considerar outros fatos que tornem evidente a impossibilidade da vida em comum.

Ao se casarem civilmente, homem e mulher mantêm laços que são vinculados juridicamente, ou seja, criam obrigações e direitos recíprocos. Preceitua ainda o Código Civil:
Art. 1.566. São deveres de ambos os cônjuges:
I - fidelidade recíproca;
II - vida em comum, no domicílio conjugal;
III - mútua assistência;
IV - sustento, guarda e educação dos filhos;
V - respeito e consideração mútuos.

É bastante claro a intenção do legislador de caracterizar a monogamia do casal, ficando evidente o seu repudio a poligamia. Atualmente o adultério está se tornando motivo de polêmicas dentro da sociedade, há pessoas que fogem as regras tradicionais, como por exemplo, o Swing que é a troca de casais com a finalidade de manter relações sexuais com mais de um parceiro e o Poliamor que como o próprio nome revela se refere a ‘vários amores’, sendo uma relação não-monogâmica onde os indivíduos  envolvidos mantêm relações tanto emocionais, afetivas como sexuais ao mesmo tempo com outras pessoas, tendo mais de um parceiro e vivendo naturalmente essa realidade.
Nos relatos bíblicos percebe-se, nas civilizações ali retratadas, a permissão social a poligamia masculina, e a nítida intolerância ao adultério feminino. A mulher que mantinha relações sexuais com outro homem que não fosse o seu marido era castigada com rigor, tendo como punição o apedrejamento em praça pública e a desmoralização de toda sua família com a perda da honra familiar. Essa poligamia masculina permitida, principalmente nos relatos do Antigo Testamento pelas leis dos homens, foi repudiada por Jesus Cristo. O Evangelho de Marcos nos mostra que os planos de Deus eram outros:
E, levantando-se dali, foi para os termos da Judéia, além do Jordão, e a multidão se reuniu em torno dele; e tornou a ensiná-los, como tinha por costume.
E, aproximando-se dele os fariseus, perguntaram-lhe, tentando-o: É lícito ao homem repudiar sua mulher? Mas ele, respondendo, disse-lhes: Que vos    mandou Moisés? E eles disseram: Moisés permitiu escrever carta de divórcio  e repudiar. E Jesus, respondendo, disse-lhes: Pela dureza dos vossos corações vos deixou ele escrito esse mandamento; Porém, desde o princípio da criação, Deus os fez macho e fêmea. Por isso deixará o homem a seu pai e a sua mãe, e  unir-se-á a sua mulher, E serão os dois uma só carne; e assim já não serão dois, mas uma só carne. Portanto, o que Deus ajuntou não o separe o homem.
E em casa tornaram os discípulos a interrogá-lo acerca disto mesmo.
E ele lhes disse: Qualquer que deixar a sua mulher e casar com outra, adultera contra ela. E, se a mulher deixar a seu marido, e casar com outro, adultera. 
                                                                                               (Marcos 10:1-12)
 Com o advento da Lei 11.106, de 28-03-2005, o crime de adultério, que era tipificado no artigo 240 do código penal como crime, torna-se um ‘abolitio criminis’, ou seja, não deixa de existir materialmente em nossa sociedade, muito pelo contrário, mas formalmente não é mais considerado crime. A ênfase, por conseguinte, é dada ao artigo 1.566 do código civil que já foi comentado anteriormente, que prevê os deveres dos cônjuges.  Havendo violação desses deveres, o cônjuge prejudicado poderá entrar, por exemplo, com ação de reparação por danos morais e/ ou materiais a depender do caso concreto e da interpretação do juiz competente, abstraindo-se de sanção penal. Em outras palavras o adultério, na legislação atual, constitui apenas uma violação moral ao dever de fidelidade ao cônjuge e não mais crime de âmbito penal.
2 UM NOVO TIPO DE ADULTÉRIO
A fertilização artificial poderá ser classificada em duas espécies: a fertilização homóloga e a heteróloga ou extraconjugal. A fertilização homóloga há utilização de material genético de ambos os parceiros. A Fertilização heteróloga ao contrário da homóloga se utiliza de material genético (sêmen ou óvulo) de terceiro para fecundação.

A propósito traz-se a colação o Enunciado 106 das Jornadas de Direito Civil do Conselho de Justiça Federal fala sobre a possibilidade de inseminação homóloga após morte do marido:

106 – Art. 1.597, inc. III: para que seja presumida a paternidade do marido falecido, será obrigatório que a mulher, ao se submeter a uma das técnicas de reprodução assistida com o material genético do falecido, esteja na condição de viúva, sendo obrigatório, ainda, que haja autorização escrita do marido para que se utilize seu material genético após sua morte

Essa referência é uma complementação do artigo 1.597, inciso III que para muitos disse pouco do que deveria dizer a respeito do assunto em questão. O artigo 1.597 considera na constância do casamento os filhos havidos por fecundação homóloga após morte do marido. O enunciado entende que para que seja aplicada a regra do artigo, deverá a mulher não ter outro companheiro ou ser casada novamente, além, é claro, da autorização escrita do marido antes de sua morte, permitindo, portanto a utilização do seu material genético. Essa técnica é a inseminação artificial homóloga, e a heteróloga?
Como sabemos o adultério é quando homem e/ou mulher mantem relações extra- conjugais, traindo o dever de fidelidade ao seu parceiro ou parceira. Com o avanço das tecnologias, mas precisamente da biotecnologia e engenharia genética é muito comum nos dias de hoje casais fazerem inseminação artificial em busca de filhos com finalidade única de constituir uma família mais completa e feliz. Para o homem doar seu sêmen para fecundar um óvulo de terceiro, chamado de fecundação heteróloga, deverá ter a anuência de sua esposa ou parceira, no caso de união estável, sob pena de descumprimento dos deveres conjugais, o mesmo acontece para a mulher, quando seu óvulo é fecundado sem o seu consentimento com sêmen estranho. Ambos os casos são considerados espécies de injúrias graves previsto no artigo 1.573 do código civil e que passou a ser conhecido pela doutrina de Adultério Casto. Se na possibilidade da mulher ser forçada com emprego de violência a fazer inseminação artificial poderá abrir margem para alegações de um estupro cientifico, que é uma modalidade moderna da doutrina amplificando a interpretação do artigo 213 do Código Penal Brasileiro que se refere a tipificação do crime de estupro.
O adultério casto é uma forma moderna de traição do dever de fidelidade e recebeu esse nome pelo fato de fugir do tradicional significado do adultério propriamente dito e de sua regra no que se refere ao fato gerador da conjunção carnal, que no referido caso não teve. A princípio parece estranho pensarmos em adultério sem cópula. Antigamente essa possibilidade era impensável e impossível de se acontecer, hoje é totalmente viável, não sendo possível exaurir ou taxar todas as possibilidades, uma vez que o Direito como sendo dinâmico, evolui com o desenvolvimento da sociedade e de suas ciências, sendo o rol de possibilidades exemplificativas.
A inseminação artificial é bastante discutida por sociólogos, doutrinadores e até pela Igreja Católica que manifesta seu ponto de vista contrário à inseminação artificial, tanto homóloga quanto heteróloga no Catecismo da Igreja Católica:
I.41.1 Inseminação artificial moralmente aceitável
§2376 As técnicas que provocam uma dissociação do parentesco, pela intervenção de uma pessoa estranha ao casal (doação de esperma ou de óvulo, empréstimo de útero), são gravemente desonestas. Estas técnicas (inseminação e fecundação artificiais heterólogas) lesam o direito da criança de nascer de um pai e uma mãe conhecidos dela e ligados entre si pelo casamento. Elas traem "o direito exclusivo de se tornar pai e mãe somente um por meio do outro"
§2377 Praticadas entre o casal, estas técnicas (inseminação e fecundação artificiais homólogas) são talvez menos claras a um juízo imediato, mas continuam moralmente inaceitáveis. Dissociam o ato sexual do ato procriador. O ato fundante da existência dos filhos já não é um ato pelo qual duas pessoas se doam uma à outra, mas um ato que remete a vida e a identidade do embrião para o poder dos médicos e biólogos, e instaura um domínio da técnica sobre a origem e a destinação da pessoa humana. Tal relação de dominação é por si contrária à dignidade e à igualdade que devem ser comuns aos pais e aos filhos". "A procriação é moralmente privada de sua perfeição própria quando não é querida como o fruto do ato conjugal, isto é, do gesto específico da união dos esposos... Somente o respeito ao vínculo que existe entre os significados do ato conjugal e o respeito pela unidade do ser humano permite uma procriação de acordo com a dignidade da pessoa."


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CONCLUSÃO
A prática do adultério com o tempo perdeu a eficácia legal na sua punição, sendo, portanto, um ponto bastante negativo para a sociedade atual que já está demonstrando as consequências negativas no seio familiar. O número de divórcio está crescendo drasticamente e proporcionalmente ao número de processos na vara de família. As famílias estão perdendo sua estrutura de apoio, estão se adequando a nova moda no qual é anormal casar com uma única pessoa e para o resto de suas vidas. O dever de fidelidade recíproca está se perdendo, os relacionamentos estão cada vez mais artificiais e passíveis de traições.
O adultério casto é um novo ramo-espécie da árvore da infidelidade matrimonial. É uma forma moderna, científica, graças aos avanços das ciências de manipulação genética e humana. O desenvolvimento das ciências humanas é fundamental, mas é certo que do mesmo modo que acarreta pontos positivos para a humanidade, cria pontos negativos, quando utilizada de maneira errônea. O bom senso, a ética, o respeito humano por certo devem prevalecer. A fidelidade conjugal e uma estrutura familiar sólida são pontos chaves que não podem ser abstraídos para que a sociedade evolua positivamente a partir dos avanços científicos.


 ¹Bacharelando do 10º período do curso de Direito

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